A
Ação Pela Identidade – API, congratula-se com a
publicação, hoje, de dois documentos fundamentais para a defesa dos
direitos humanos das pessoas intersexo. O Comissário para os
Direitos Humanos do Conselho da Europa, Nils Muižnieks, publicou um
relatório histórico e inovador, sobre direitos humanos e pessoas
intersexo. Por sua vez, a Agência para os Direitos Fundamentais da
União Europeia publicou, pela primeira vez, um documento sobre a
situação das pessoas intersexo na Europa.
O
documento da Agência Europeia para os Direitos Humanos (FRA) avança
com dados alarmantes. Em comunicado, o diretor interino desta agência
da União Europeia (UE), Constantinos
Manolopoulos, afirma que "os
direitos das pessoas intersexo têm sido amplamente ignorados
pelos decisores políticos e legisladores de
toda a UE ao longo dos últimos
anos",
esclarecendo que "o
trabalho da FRA aponta para alguns dos desafios mais
urgentes que precisam de ser
abordados, para que se quebre
as barreiras discriminatórias mais
persistentes e se
alivie
o sofrimento desnecessário causado
por intervenções médicas".
O
documento baseia-se em evidências recolhidas
durante a terceira actualização do
relatório da FRA
sobre discriminação em razão
da orientação sexual e
identidade de género
que, pela primeira vez, cobre
a discriminação sofrida pelas pessoas
intersexo. O relatório completo, que se
baseia em dados recolhidos até meados de
2014 em toda a UE, será publicado ainda este ano. No
que toca às pessoas intersexo, o documento hoje publicado, foca-se na
obrigatoriedade de registar as crianças intersexo como do sexo
masculino ou feminino, e na dificiculdade de alterar posteriormente
esse registo, assim como a persistência em efectuar cirurgias
corretoras em bebés e na falta geral de proteção contra a
discriminação.
Já
o Comissário Europeu para os Direitos Humanos, à semelhança do seu
antecessor, Thomas Hammarberg – que após a publicação de um
relatório semelhante sobre direitos humanos e identidade de género
redefiniu globalmente as perspetivas em que se baseava a construção
de políticas e legislação relativas às pessoas trans, – Nils
Muižnieks avança com um contributo para garantir o reconhecimento
das pessoas intersexo, – de uma forma que reafirma inequivocamente
os direitos humanos destas pessoas.
“São
necessários esforços específicos para assegurar que as pessoas
intersexo são protegidas contra crimes de ódio. Indivíduos
intersexo são vulneráveis ao discurso de ódio e à violência
quando revelam a sua condição intersexo e quando o seu
comportamento ou aparência não corresponde a noções
estereotipadas das normas masculinas e femininas”,
afirmou o comissário durante uma
conferência decorrida no dia de ontem, onde apresentou o novo
documento. “As
sociedades europeias permanecem em grande parte inconscientes em
relação às suas vidas”,
alertou, seguindo
o mesmo sentido das conclusões da FRA.
O
documento, que constitui um estudo aprofundado sobre a situação dos
direitos humanos das pessoas intersexo, comparando a situação real
enfrentada por estas pessoas na Europa, e as melhores práticas que
têm vindo a ser postas em prática ao nível global, traça algumas
recomendações que devem ser levadas a cabo pelos estados-membros do
Conselho da Europa (incluíndo Portugal).
“A
suposta dicotomia de género e correspondentes
normas médicas resultam numa rotina
de intervenções médicas e
cirúrgicas sobre as pessoas intersexo,
mesmo sem estas serem adequadamente
consultadas
ou informadas
antes de tais procedimentos. O
sigilo e a
vergonha em torno dos
corpos intersexo
têm permitido a manutenção de tais práticas, enquanto que
as
questões de direitos humanos em causa têm permanecido na sua maior
parte por abordar”, descreveu
o comissário, frisando: “o
respeito pelos direitos das
crianças
é uma das questões centrais”.
Santiago
D'Almeida Ferreira, co-diretor da API, assinala o considerável
avanço que a publicação destes documentos significa, alertando: “é
urgente que as pessoas intersexo sejam reconhecidas pela lei, e que
os seus direitos sejam assegurados”. E acrescenta: “Portugal
deve tomar medidas como as aconselhadas pelo Comissário europeu e
pela FRA, e começar por investigar em que condições vivem as
pessoas intersexo no nosso país, assim como legislar no sentido de
proibir cirurgias reparadoras e outros tratamentos não consentidos,
e implementar medidas efectivas contra a discriminação”.
A
Ação Pela Identidade – API
é uma organização não-governamental para a defesa e o
estudo da diversidade de género e de características sexuais,
incluindo a experiência das pessoas trans e intersexo. Partimos de
uma perspectiva de igualdade e não-discriminação, abrangendo
raça/etnia, sexo/género, situação sócio-económica, deficiência
e religião, etc.
Pessoas
intersexo são
pessoas que não podem ser classificadas de acordo com as normas
clínicas dos
chamados corpos femininos e masculinos, no
que diz respeito ao
sexo cromossómico,
gonadal ou anatómico.
Este último torna-se evidente, por exemplo, nas características
sexuais secundárias, tais como a massa muscular, a distribuição de
cabelo e estatura, ou nas características
sexuais primárias,
tais como genitália interior e exterior e/ou estrutura cromossómica
e hormonal.
Santiago
D'Almeida Ferreira,
co-diretor e porta-voz intersexo da
API,
está disponível para declarações e entrevistas, a partir do
e-mail associacaopelaidentidade@gmail.com
O
relatório “Human Rights and Intersex people”, publicado pelo
Comissário Europeu para os Direitos Humanos está disponível para
download em:
O
documento da FRA, “The fundamental rights situation of intersex
people”, está dispnível para download em: